Você sabe diferenciar a verdade dos boatos quando recebe aquela notícia “urgente” pelo WhatsApp ou pelo Facebook?
Descubra neste guia como não propagar rumores pelas redes sociais.

Seis eixos são relevantes na identificação de notícias falsas: fonte, evidência, contexto, público-alvo, propósito e execução. Para cada um deles, uma série de perguntas podem ser feitas para ajudar o leitor a identificar se está diante de uma notícia verídica ou não. Confira a seguir mais informações sobre cada um desses pontos:
1. FONTE
2. EVIDÊNCIA
Busque no texto por informações que você pode verificar, como, por exemplo, nomes, dados, locais e citações a documentos ou pesquisas. Questione-se: quais informações são usadas no conteúdo para sustentar os fatos? Os fatos apresentados realmente se sustentam com essas informações? Os dados apresentados são estatísticas de uma fonte de informações confiáveis ou nem sequer são citadas no texto? Citações genéricas como “de acordo com pesquisas” ou “estudos afirmam” são comuns em notícias falsas e gêneros afins. Observar se há aspas de alguma pessoa citada no texto também deve ser objeto de observações. Outras perguntas relacionadas às falas de especialistas e pessoas citadas no texto também devem ser alvo de questionamento: quem é essa pessoa que está falando? Qual é a sua função profissional? Ela tem conhecimento para falar sobre aquele assunto? Há alguma evidência de que ela está falando a verdade? Procure por outras notícias veiculadas em fontes confiáveis que tenham reverberado as falas do interlocutor.
3. CONTEXTO
Todas as notícias existem dentro de um contexto. Esse contexto é complexo: ele é histórico, social, econômico, cultural, temporal... Pergunte-se: qual é o cenário geral dessa notícia? Ela apresenta um panorama completo da história ou omite informações? O que está sendo deixado de fora do texto? O contexto do lançamento daquela notícia possui algum outro condicional ou acontecimento (como eleições) que podem ter gerado aquele conteúdo com o propósito de influenciar visões? Considere diferentes forças em torno daquele fato, como acontecimentos atuais, tendências culturais, objetivos políticos e pressões financeiras e de mercado.
4. PÚBLICO-ALVO
Entender para quem o conteúdo foi feito também pode ajudar a identificar se tem algum viés ou intencionalidade que não está visível à primeira vista. Qual é o público-alvo pretendido? São pessoas que compartilham algum interesse em comum? Qual é o interesse do grupo? As informações apresentadas se respaldam unicamente sobre esse interesse ou também apresentam dados que possam equilibrar esse interesse? Preste atenção aos apelos a grupos específicos ou pessoas. Essas informações podem não estar presentes diretamente nas informações apresentadas no texto, mas também na linguagem usada pelo conteúdo, técnicas de apresentação dos pontos levantados pelo texto (que podem, por exemplo, seduzir o leitor e levar a uma conclusão enviesada) e escolha de imagens.
5. PROPÓSITO
Todas as notícias compartilham o fato de que foram criadas por alguém e com algum propósito. Entender a razão disso é a base para o letramento midiático. A pergunta chave é: por que esse texto foi escrito? É para informar sobre algum acontecimento? É para te convencer de alguma perspectiva ou sobre algum tema? Quem pode se beneficiar com a circulação dessa informação? É para te convencer a comprar algo? É para divertir, como no caso das sátiras? A observação de fatores como a missão da publicação em que o texto está sendo veiculado, linguagem ou uso de imagens persuasivas, técnicas para fazer dinheiro (o caça-cliques) e posições declaradas (ou não declaradas) sobre a temática podem dar pistas sobre o propósito do conteúdo em questão. Além disso, o usuário pode se questionar sobre qual o sentimento que aquela mensagem lhe causa. A maioria das notícias falsas tende a inspirar sentimentos fortes nos leitores, como indignação ou grande surpresa, fazendo com que o leitor se sinta com necessidade de compartilhar aquele sentimento – e conteúdo – com suas redes.
6. EXECUÇÃO
O modo como o conteúdo é produzido e apresentado esteticamente também dá pistas sobre a veracidade do que está sendo veiculado. Estilo de texto, gramática, tom, escolha de imagens, posicionamento e layout são alguns elementos que podem dar indicações sobre a credibilidade da publicação. A pergunta principal sobre a execução é: como as informações estão sendo apresentadas? Há uso de adjetivos que possam enviesar a leitura? Algumas palavras aparecem em caixa-alta (aquele famoso CAPS LOCK LIGADO) no título ou corpo do texto? Esses recursos costumam ser utilizados para criar reações emocionais nos leitores e são evitados em textos jornalísticos. O design da página e escolha de fontes parece ruim ou o texto mal escrito? A baixa qualidade também é característica das notícias falsas. Bem como o uso da caixa-alta, esses sites costumam apresentar erros gramaticais, imagens sensacionalistas (que muitas vezes foram manipuladas) e manter diversos anúncios pela página (muito mais do que qualquer outro veículo de credibilidade) ou mesmo propagandas em pop-ups difíceis de fechar (que você acaba clicando e abrindo antes mesmo de conseguir fechar o pop-up).Como a escola pode levar o tema para a sala de aula?
As diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) apresentam a necessidade de trabalhar com esses novos letramentos, os digitais e também os multiletramentos. Apesar de ser melhor explorado em Língua Portuguesa a partir do 6º ano do Ensino Fundamental, o letramento midiático deve ser transversal às séries e componentes curriculares. “Desde cedo as crianças podem e devem ter contato com o tema porque já faz parte da vida deles”, ressalta Carlos Eduardo Canani, mestre em Educação, professor de Língua Portuguesa e diretor de ensino na Secretaria Municipal de Lages (SC). As oportunidades são inúmeras, focadas em cada área do conhecimento.
O QUE A BNCC DIZ SOBRE O TEMA
“A viralização de conteúdos/publicações fomenta fenômenos como o da pós-verdade, em que as opiniões importam mais do que os fatos em si. Nesse contexto, torna-se menos importante checar/verificar se algo aconteceu do que simplesmente acreditar que aconteceu (já que isso vai ao encontro da própria opinião ou perspectiva). [...]
Eis, então, a demanda que se coloca para a escola: contemplar de forma crítica essas novas práticas de linguagem e produções, não só na perspectiva de atender às muitas demandas sociais que convergem para um uso qualificado e ético das TDIC – necessário para o mundo do trabalho, para estudar, para a vida cotidiana etc. –, mas de também fomentar o debate e outras demandas sociais que cercam essas práticas e usos. É preciso saber reconhecer os discursos de ódio, refletir sobre os limites entre liberdade de expressão e ataque a direitos, aprender a debater ideias, considerando posições e argumentos contrários.[...]
Essa consideração dos novos e multiletramentos; e das práticas da cultura digital no currículo não contribui somente para que uma participação mais efetiva e crítica nas práticas contemporâneas de linguagem por parte dos estudantes possa ter lugar, mas permite também que se possa ter em mente mais do que um “usuário da língua/das linguagens”, na direção do que alguns autores vão denominar de designer: alguém que toma algo que já existe (inclusive textos escritos), mescla, remixa, transforma, redistribui, produzindo novos sentidos, processo que alguns autores associam à criatividade. Parte do sentido de criatividade em circulação nos dias atuais (“economias criativas”, “cidades criativas” etc.) tem algum tipo de relação com esses fenômenos de reciclagem, mistura, apropriação e redistribuição. Dessa forma, a BNCC procura contemplar a cultura digital, diferentes linguagens e diferentes letramentos, desde aqueles basicamente lineares, com baixo nível de hipertextualidade, até aqueles que envolvem a hipermídia.”
FONTE: Base Nacional Comum Curricular, págs. 66-70
Os alunos dos 6º e 8º anos e do Ensino Médio possuem uma base de aprendizados que lhes permite fazer verificações mais complexas, que envolvam, por exemplo, busca reversa de imagens para checar possíveis montagens ou antecedentes de publicação daquela foto e raspagem de dados. No entanto, na prática convencional da interpretação de texto, é possível adicionar parte desse conhecimento desde que as crianças aprendam a ler os princípios básicos da checagem de informações até mesmo em um texto do livro didático.
“O professor pode sempre inserir a busca de contexto e fontes, seja na autoria do livro ou nos textos de terceiros que são utilizados e citados no livro”, sugere Pollyana Ferrari. Para a professora de hipermídia, o importante é estimular a criança a se questionar e ir atrás de informações. “Isso é possível fazer na lousa ou em um espaço ao ar livre, não precisa necessariamente de internet ou chegar na verificação em sala”. Utilizar os próprios conteúdos suspeitos que os alunos receberam nos grupos dos quais participam no WhatsApp pode ser um bom material de trabalho por já estar inserido no dia a dia dos estudantes.
“São os assuntos do trending topic [os conteúdos mais acessados] que abastessem as notícias falsas, não aqueles dos quais ninguém está falando”, atenta Pollyana. Esses assuntos podem embasar práticas de sala de aula sem entrar em questões políticas. “Opiniões, cada indivíduo e família tem as suas. Mas fato é fato. Se o tema é o aumento da mortalidade infantil, vamos ver se isso é um dado? Veio de onde? Aumentou quanto? Por quê? Aumentou a pobreza?”, exemplifica. Para ser uma experiência conectada com a realidade, ela precisa ser próxima do universo e temas com os quais os alunos se deparam nas mídias digitais. “Trabalhar as mentiras sobre a II Guerra Mundial é legal. Mas essa criança nasceu em 2010, é bem difícil se conectar com esse tema. Quanto mais próximo, mais fácil é que ele se aproprie do conhecimento”.
Quando se trata do trabalho de temas transversais, é muito comum as escolas proporem trabalhos pontuais e isolados sobre esses temas. Mas eles não são suficientes para garantir o letramento midiático. “Fica um trabalho fragmentado e não representa aprendizado e formação de leitores críticos”, considera Carlos Eduardo. Outros equívocos comuns, de acordo com o professor, é pensar que o trabalho com gêneros midiáticos garante o letramento e que inserir o digital é trabalhar com letramento midiático. “O professor precisa pensar no desenvolvimento de estratégias para garantir isso”.
O trabalho é contínuo ao longo de toda a Educação Básica. “E quando este aluno chegar ao Ensino Médio, imagine que bagagem! Ele não vai acreditar só porque está circulando”, diz Pollyana. “Ele vai questionar a informação que está na TV aberta, vai questionar o filme no cinema, uma frase machista ou homofóbica que ouviu, vai ter mais consciência ao compartilhar conteúdos. Isso é letramento midiático”, define. E lembre-se: na dúvida, não compartilhe!
FONTE: nova escola